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Hoje no meu acordar ouvia alguém de longe dizer “uma vez por mês!”. Só se pode “uma vez por mês”.

Mas só se pode o quê? E lá olhei para a TV com atenção. Falavam de Bolas de Berlim. Ainda que o apresentador dissesse “uma vez por semana”, a nutricionista com olhos incisivos dizia “uma vez por mês”.
Perdoem-me porque pequei. Não foi nem uma vez na semana e de longe a única do mês.
Se são 400, restam-me 1100 calorias no dia. Devo sobreviver com as míseras? Perdoem-me porque pequei, não conto calorias. Não sejam mordazes comigo! Vá lá! Eu peso-as! Peso-as na balança depois! Mantenho religiosamente aqueles 5 kg a mais.
Na verdade aquilo enervou-me solenemente, foi como se tivessem aniquilado o negócio do Zuquinha na praia da Mata e fizessem a extração de sorrisos para benefício da máfia. É que uma bolinha pode deixar alguém verdadeiramente feliz!

Hoje algures a meio da tarde disseram-me “estás a fazer 32 anos, devias pensar em casar e ter filhos”. Perdoem-me porque pequei, na verdade não penso em casar, nem penso ter filhos para agora (o que não quererá dizer que não existe amor em mim). Não tenho essa urgência. Talvez um dia aconteça, mas não faço vida para que aconteça. Entendem-me? Vivo os meus dias, não os empurro com toda a força que tenho para um projeto familiar fotografado como se a felicidade de uma vida inteira dependesse do esperado por todos. E os mais antigos dizem “queria ver-te arrumada”, mas a esses eu sorrio, porque são mimosos, impossíveis de não abraçar e dar beijinhos. A esses o meu honesto: perdoem-me porque pequei, aos outros, peço-vos, entendam-no como sarcasmo. E o honesto, em honra do vosso tempo precioso, tempo que a minha demora talvez vos falhe, no dia de não poderem estar presentes por minha culpa. Isto, só isto.

Ah e perdoem-me por ter esta admiração por velhos, mais do que a que tenho por crianças. Tirando uma em particular, a que a minha irmã me deu. Essa pequena está de facto imbatível. Mas ainda assim não me veio a vontade. Perdoem-me porque peco a toda a hora repetida vezes.

E estes perdões só para alguns: perdoem-me servir o café sem pires e colocar a xícara na mesa assim, nua. E perdoem-me ter ficado só pela Europa. Ainda não apanhei um avião de longo curso. Perdoem-me porque pequei.

Como não invejo outras vidas que me estão perto se estou sempre a pecar? Não tenho a ânsia de ser a pele de outrem ao vestir a “felicidade” confirmada e o “check” na minha testa como um anúncio de paz.

Prefiro-me com todos os “pequei” ainda que me falte tanto. Peque eu mais vezes e peque enquanto houver vida em mim. Se é que isto é pecar!

Gabriela Relvas

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