Ontem uma voz disse-me… e depois sussurrou-me, “chiuuuu é segredo”.
Guardei-o. Como quem cuida de uma criança.
Hoje a chuva teve graça. O senhor do café era assim. Rabugento, mal encarado, o cartoon daquela banda desenhada que eu havia traçado. Mas antes de cartoon era pessoa. Ele era pessoa! E eu vi-o absolutamente esta manhã. Achei-me malévola quando quase me esboçou um sorriso. Ia contra tudo aquilo que eu convictamente afirmava, dura, chata.
O que se passava comigo? Estava estranha. Teria sido do pequeno almoço? Tinha um sorriso parvo no rosto. E o que mais me intrigava: devia ter piada! Tinha a sensação que me sorriam de todos os cantos. Olhos nos olhos. E era bom. Quase constrangedor. Mas ai que era bom. Que era bom era!
Depois do trabalho fui ao ginásio. Fiz um treino… que rico treino. Este deve ter feito mesmo alguma coisa. Testei a minha flexibilidade e genica sem medos, sem dores aqui e ali, as mazelas deviam estar lá, mas não me lembro delas. Desfiz-me em água. E que bom que foi!
Há pouco fui ver a minha avó. Ela que tem nas minhas pernas as pernas dela. E espera que eu tenha tempo de a ir ver. A verdade é que o tempo arranja-se. E a verdade é que eu sou feia. E devia chamar-me assim muitas vezes. Todas as vezes que não a vou ver. Estar com ela este fim de tarde foi a melhor coisa de que me lembro entre as minhas coisas melhores que pretendo lembrar-me para sempre.
Estou cansada. Esbarrei-me comigo e despertei todos os sentidos. Vou dormir bem. Tenho a certeza. Não me lembro de dormir bem.
Ontem contei um segredo.
GR
