Cabeças, braços, tronco, pernas. Cabeças de várias cores, por causa dos cabelos. Ao longe lembram-me fósforos. Apagados. De perto, feios, invariavelmente feios. Transpiramos que nem porcos. Dentes. Uns mais afiados que outros. Uns, mais lavados que outros. E, de novo, ao longe, tal qual baratas, tontos.
Da varanda do terceiro andar do shopping vêem-se pessoas. Muitas pessoas. As pessoas mexem-se muito. Algumas trazem pessoas pequeninas em carrinhos. Da varanda do terceiro andar do shopping vêm-se coisas, que agora, particularmente agora, me aparecem com este desapego. É esta a palavra, desapego.
Quase que ouço a película a rolar, não tenho comando nas vozes que me têm passado na cabeça. Falo comigo, só comigo, de mim para mim. Não sabia o quanto é fodido sentir desapego. Fodido não, fodido é uma palavra que à partida, ferve. No desapego não ferve nada.
É aqui o ponto de onde se vê tudo, certo? Quando te desligas, mas continuas ligado. É aqui. Então é isto mesmo avô, perguntei-te quando partiste para a outra dimensão. A dimensão que, afinal, não existe. Não me respondeste. Não ouviste. Não olhas daí de cima e vigias. Nem por curiosidade, para ver o que estes estarolas andam a fazer, os do sangue.
Não há nada para além disto e queremos foder esta merda toda. Ensaios nucleares, bombas de hidrogénio, mísseis balísticos, estatutos de potência nuclear. Tem-se estatuto de potência nuclear!
No metro encaixo os phones. Fico na minha sala privada. Não me misturo. Não abraço ninguém. Ninguém me abraça também. Mas estamos colados. De novo, a transpirar que nem porcos. Da mesma forma que dois corpos fazem amor e fazem de dois líquidos só um. Excretamos então, juntos, dejetos de nitrogénio, só que sem amor. Uns albergam relógios caros nos pulsos e acham que os dejetos deles são diferentes dos nossos. Uns. E outros, outras coisas.
Mudo de playlist. Jamie Cullum, Grand Torino. Linha verde. Penso na possibilidade de alguém se fazer explodir. De mim para mim, respondo-me:
– Que não faça doer, ou ficar.
Última paragem.
Onde pára o Amor? Onde foste parar Amor? Amor! Amor! Amor! Amor! Amor! Amor! Amor que move as montanhas. Amor que apazigua. Amor que alimenta, aquece. Amor que abraça para sempre. Amor que nos une. Amor, estou de joelhos, a mendigar.
Gabriela Relvas
Haverão sempre pessoas que te amarão. Quanto ao mundo infelizmente é esta a realidade. E sim, é doloroso tanta falta de amor no mundo e ignorância. Oxalá a vida nos traga a todos amor.
A tua intensidade é genuina e apaixonante, deves ser uma alma imensa e deixo por isso um abraço daqueles primaveris e sem corpo. Porque és um campo de flores iluminado pelo sol. Abraço doce
Gostei tanto das tuas palavras… foi mesmo um abraço primaveril.