*O Dom do Tom*
Não nasci com o poder de argumentação avassalador capaz de desarmar os mais rijos e bem preparados. Desconcertante vocabulário fluído nos corredores, nas palestras, no atender de chamadas, nas discussões domésticas, nos almoços de trabalho. Não nasci.
Isto é tão certo quanto eu ser eu e tu seres tu.
Tu, o frenético pensar. E o rasgo na solução para decisões importantes. O que implica vem depois.
Eu, o meu levar tempo tão meu que o consigo odiar por conhecê-lo tão bem.
Seria o pior político. O pior comentador. Mas devo-te vassalagem. Dava-me jeito ser como tu. Dava. O Labirinto seria bem menos assustador. Tens nas tuas palavras o derrubar de barreiras. Invejo-te. Tenho até ciúmes.
Dizem que falo com os olhos. Contam aquilo que eu gosto e não gosto com muita clareza. Contam até quando não estou preparada. Desarmam-me porque dizem quando tenho medo. Desobedientes. Obstinados.
Queres viver na minha pele e eu na tua? Só por uns tempos. Para ver como funciona? Tenho sede de saber como é estar em ti. Mas depois dou-te de volta sim? E quero-me a mim. É que já ganhei amor a esta coisa de ser transparente na hora errada.
Não tenho o dom do tom. Tenho-me sempre, a qualquer hora. Ora entusiasta, ora destruída. Ora apaixonada.
Tem a minha verdade lugar na caixa dos teus receios?
Sabes…
Eu sinto que sim.
E isso faz-me sentir enorme ao teu lado.
Obrigada. E desculpa interromper. Podes continuar.
GR