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Aprendi a gostar de papel no tempo quando. Quando estava nesse estado imperceptível de ficar maior. Quando fico maior hoje e amanhã. O meu pai assegurou-se de me passar isso, não fosse ele O transformador de papel, que das folhas que não terminam, faz com as mãos, cadernos que cabem nas mochilas e outros só debaixo dos braços, pelo grande tamanho. 

Lá dentro, entre a capa e a contracapa, insistentes folhas de desenho. Talvez venha daí, não faço ideia, esta minha sede de contar histórias. As possibilidades de um enorme papel branco foram-me sempre apresentadas. Os cadernos A3 praticamente do meu tamanho, desafiantes mares de nada e de tudo ao mesmo tempo, prontos a ser preenchidos por aquilo o que eu quisesse. Devia ter 4 anos.

O meu cabaz tinha então que ter impreterivelmente uma boa dose de castanhas, aqui e ali queimadas pelo fogo, meia dúzia de diospiros, maduros, 3 filmes que perturbassem a alma e um caderno com folhas de gramagem 120. Depois vinha então uma caneta básica, pouco pesada e livre de estatuto. Além disso, as canetas pesadas magoam-me os dedos e não lhes percebo o fim. Pisa papéis?

Não sei se já vos aconteceu algo parecido. A mim acontecem-me coisas com esta inutilidade notável, que é, elaborar o meu próprio cabaz de Natal enquanto passeio o carrinho de compras pelo corredor do hipermercado, ao analisar cabazes feitos por outros. Nem lhe acrescentei uma garrafa de azeite. Nem tâmaras. Eu gosto de tâmaras. Esqueci-me delas. Eu sou boa a subtrair a minha possível “fortuna”. Na possibilidade de me aparecer o génio da lâmpada, se estiver com fome, peço-lhe castanhas e 2 diospiros. 

Felizmente há sempre uma folha branca, gramagem 120, pronta a ser preenchida por aquilo que eu quiser.

Há quem chame a isto de independência. Eu chamo-lhe falta de ginga, com a certeza que recomeçar não é mais assustador que desafiante.

Gabriela Relvas

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